À volta de Valência: desde o sonho de recordes ao impacto económico


(foto organizadores)

Este fim-de-semana, Espanha recebe a organização da Meia Maratona de Valência Trinidad Alfonso EDP, a terceira prova de etiqueta de ouro (Gold Label Road Race) da Federação Internacional (IAAF).
Depois das etiquetas das meias maratonas de Lisboa (na primavera e no outono), Valência recebeu esta distinção da IAAF em 2016 e isso foi também graças às muitas visitas a Lisboa feitas por Paco Borao, o diretor da prova, que foi tendo bases suficientes para poder elevar a sua prova à distância de melhor meia maratona espanhola.
E, para este ano, a aposta valenciana é enorme para um desfecho de grande impacto no próximo domingo. É que os organizadores almejam conseguir ali um recorde mundial na distância e, ao invés de outras competições, que apostam num dos sexos, aqui é nas duas corridas!
Tendo já batido os recordes de inscrições, que chegarão certamente a números imponentes, a prova, entre outros atletas, apresentará à partida os detentores das melhores marcas mundiais do ano, os quenianos Abraham Cheroben e Joyciline Jepkosgei. Ele, que já venceu em Valencia em 2014 (58,48, recorde da prova), venceu este ano a meia de Copenhaga em recorde pessoal (58.40), a melhor marca mundial do ano. O recorde pretendido, 58.23, por Zersenay Tadese, foi obtido em Lisboa, a primeira prova ibérica a contar com a Golden Label da IAAF. Entre outros, destaca-se a presença de Stephen Kosgei Kibet, vencedor em 2016, e o vencedor da meia de Lisboa, em março, o neo-zelandês Jake Robertson.
Nas mulheres, a cabeça de cartaz é Joyciline Jepkosgei, recordista mundial com a marca de 1:04.52, conseguida em Praga, em abril, que foi também a primeira mulher a baixar dos 30 minutos em 10 km (29.43, também em Praga 2017).

O poder económico valenciano 

Como é que Valência consegue um conjunto de atletas de grande valia (só falámos nos cabeças de cartaz)?
As respostas podem ser afloradas por outros indicadores, como aquele com que nos deparámos no site dos organizadores, “Valencia Ciudad del Running”: “36 Maratón Valencia Trinidad Alfonso EDP 2016 – Impacto Econónimo y Valoración de los Corredores”.
Ficámo-nos só pelas “contas”, em resumo, que são estimados em mais de 29 milhões de euros!
Em mais detalhe, verificamos que a organização em si é responsável pelo gasto de 3.758.067 euros (3.014.081 sem impostos), que têm proveniência do patrocinador direto, Fundacion Trinidad Alfonso (2.510.272 euros, 66,8%), de recursos próprios (29,2%) e de colaborações institucionais (4%).
Outra fatia importante vem dos participantes e acompanhantes à prova, que são estimados em 13.247.380 euros, de 9060 concorrentes espanhóis (com uma média de gastos de 87,5 euros por pessoa, ficando 2 a 3 dias na cidade) e de 7371 estrangeiros (média de gastos de 111,4 euros por pessoa, ficando 3 a 4 dias na cidade).
Daí se extrapolar para o gráfico que apresentamos, que dá um impacto económico de mais de 29 milhões de euros e um total de 350 empregos anual.



E em Lisboa?

Em relação concretamente a Lisboa, não temos um estudo de impacto económico direto de cada uma das provas, mas em Janeiro de 2016, um estudo efetuado  pelo INDEG / ISCTE para a Câmara Municipal de Lisboa, “Avaliação do Impacto dos Grandes Eventos Desportivos em Lisboa | 2014/2015”, que incidia sobre 17 eventos desportivos, estimava um valor acima dos 100 milhões.
Mais tarde, em Maio de 2017, no âmbito do Mestrado em Gestão do Turismo e Hotelaria a Universidade Europeia,  Nádia Filipa Pinheiro Pais apresentou como Dissertação/Projeto Final para Obtenção do Grau de Mestre, o trabalho “Impacto de Eventos Desportivos no Turismo em Lisboa - Estudo de caso: UEFA Champions League Lisboa 2014”, sob a orientação do Professor Doutor Luís Lourenço, “pelos dados apurados e analisados, estima-se que o impacto económico da final UCL Lisbon 2014 resulte em 409,8 milhões de euros, entre gastos com restauração, viagens, receitas de bilheteira, publicidade, segurança, merchandising e direitos televisivos, incluindo a preparação e o rescaldo do evento. Este valor encontra-se distribuído, sendo que 29,5 milhões de euros serão para o clube vencedor, 21 milhões para o clube vencido, 46,3 milhões para a cidade de Lisboa, 154 milhões para o mercado espanhol e, por último, 159 milhões para o mercado mundial. Verifica-se assim que, a economia portuguesa faturará apenas 11% do total de receitas geradas pela final de Lisboa.
Portanto, tendo-se verificado a presença de mais de 50.000 pessoas no estádio do Sport Lisboa e Benfica neste evento, podemos fazer algumas contas cruzadas sobre o impacto de uma prova como a Rock’n’Roll Maratona de Lisboa EDP e a Rock’n’Roll Meia Maratona de Lisboa Santander Totta RTP, que registou mais de 25 mil participantes nos seus eventos (11992 chegados na meia e na maratona – este é o valor considerado para o resto do artigo). Sendo que a despesa média em Lisboa em 2017 é sensivelmente idêntica à de Valência 2016, podemos pensar nos mesmos valores gastos na economia portuguesa (segundo alguns artigos, fala-se em 100 euros por dia, dos estrangeiros, e cerca de 75 euros por dia, dos visitantes nacionais em Lisboa).
Assim, estiveram 6186 estrangeiros em Lisboa e, se pensarmos que estiveram cá três dias, teremos uma verba de mais de 618 mil euros, sem contabilizar as viagens e os valores de inscrição. Já os nacionais (5806), apenas vamos considerar metade deles nas verbas referidas (75 euros) e apenas em dois dias, pois mais de metade dos participantes vivem na Grande Lisboa, com menos despesa na cidade, até porque os transportes, para eles, eram gratuitos.
Assim teremos uma verba superior a 217 mil euros. Somando os estrangeiros e os portugueses temos um impacto estimado de cerca de 840 mil euros. Agora, se contarmos com corredores da Grande Lisboa e respetivos acompanhantes e participantes na mini maratona, e outros fatores, como as despesas da organização, desde as estruturas aos serviços, bem como a despesa que centenas de colaboradores fazem nos cinco dias de organização, bem como os empregos totais anuais dos fornecedores da prova, serviços de transportes, higiene urbana, etc., transmissão televisiva, certamente chegaremos a números acima de dois milhões.
Ainda assim, muito longe da cidade espanhola. E o impacto desportivo mundial, até agora, tem sido muito maior.

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